Há muito que o chamado “efeito escola” entrou na literatura científica das ciências da educação, na realidade há cerca de cinco décadas. A suposição de que todos os alunos aprendem ao mesmo ritmo, no mesmo grupo etário, adquirindo todos o mesmo conjunto específico de competências escolares, é uma perspetiva muito influenciada pelas políticas de universalização do acesso à educação escolar e de obrigatoriedade escolar, que esbarra numa compreensão mais sustentada acerca do desenvolvimento humano, seja da psicologia do desenvolvimento ou das neurociências. A igualdade de oportunidades e a igualdade de oportunidades educativas para todos acabaram por transportar para dentro das escolas, quer uma certa legitimação das desiguais capacidades construídas previamente aos percursos escolares, quer uma naturalização das desigualdades de resultados escolares dos alunos, como que um fatalidade social e escolar. Se é verdade que “está na ‘natureza’ da escola reproduzir as desigualdades sociais produzindo as desigualdades escolares”, como diz Dubet, e que a exclusão escolar ratifica ou mesmo provoca cada vez mais, pelo processo de democratização e de massificação escolar, a exclusão social, também é verdade que a “escola desempenha um papel autónomo na formação dos mecanismos de exclusão” (idem), ultrapassando uma função de simples reprodução das desigualdades sociais. Mortimore dizia, em 1988, que “a escola conta”, e conta de modo muito incisivo: ela pode não só fragilizar quem chega à escola com enormes desvantagens socioculturais e económicas, como pode ter um impacto muito positivo na progressão escolar de todos os alunos. A qualidade global da escola, o seu ethos positivo e esperançoso, o bom desempenho profissional dos seus professores, a qualidade dos processos organizacionais e educativos desenvolvidos para promover o sucesso de todos e de cada um dos alunos, um trabalho cooperativo entre docentes e entre os órgãos de gestão pedagógica da escola, além de lideranças transformacionais, presentes e capazes de imprimir um sentido de compromisso na ação quotidiana, surgem como elementos centrais preditores do bom rendimento escolar de todos os alunos e, logo, das escolas. Sabemos bem que escolas inscritas no mesmo país e sob as mesmas normas, em meios sociais idênticos, têm desempenhos por vezes muito diferentes. Assim sendo, sem menosprezar os efeitos conhecidos seja dos contextos socioculturais seja dos decorrentes das políticas públicas de educação, está também na missão das escolas rever e alterar o tipo, a articulação e o resultado dos “efeitos” que lhe são próprios. Este número da Revista Portuguesa de Investigação Educacional, dedicado ao tema “escolas, melhoria e transformação”, aborda precisamente um conjunto de pesquisas que evidenciam este labor persistente das escolas para melhorarem o seu desempenho social, desde as estratégias pedagógicas às equipas educativas, desde o papel dos professores e da supervisão por pares até às práticas de autoavaliação institucional e à formação permanente dos docentes. Com este número esperamos ter dado mais um passo na senda da visibilidade internacional do nosso trabalho de vários anos. Não só publicamos artigos de outras partes do mundo, como nos colocamos mais perto da indexação internacional de mais elevado nível. A todos os que apostaram na nossa revista, ao longo dos anos, fica aqui um reconhecimento da direção e um compromisso de nos mantermos vivos e fiéis ao desiderato de uma escola mais comprometida com o bem comum e mais justa para todos e cada um dos cidadãos, desde a educação pré-escolar até à educação ao longo da vida e com a vida.
Índice
Nota de apresentação
Joaquim Azevedo
Equipas educativas e comunidades de aprendizagem
Educational teams and learning communities
Joaquim Machado | João Formosinho
Contributos da observação de pares multidisciplinar nas práticas reflexivas de professores dos ensinos básico e secundário
Contributions of multidisciplinary peer observation to reflective practices of elementary and secondary teachers
Ana Mouraz | Sónia Valente Rodrigues
Maria Manuel Guedes | Fátima Carvalho
Sobre as práticas de observação docente – O uso de instrumentos de registo para a observação em parceria da sala de aula
On the observation of teaching practices – The use of instruments in the peer observation of teaching
Alexandra Carneiro
Um Modelo Integrado de Promoção do Sucesso Escolar (MIPSE) – A voz dos alunos
An integrated model of school success promotion (MIPSE) – The students’ voice
Ilídia Cabral | José Matias Alves
Mediação pedagógica: o sucesso como paradigma
The Pedagogical mediation: the paradigm of teaching activities
Cristina Palmeirão
Autoavaliação e Melhoria das Escolas: numa lógica de compromisso
School self-assessment and improvement: in a logic of engagement
António Manuel Branco Oliveira
Estratégias formativas e impactos no desenvolvimento profissional dos professores
Training strategies and impact on the professional development of teachers
Luísa Orvalho | José Matias Alves
A Universidade do Porto e a formação inicial de professores
Initial teacher training in University of Porto
Paulo Jorge Santos | Maria Felisbela Martins
Construir uma escola democrática e justa: o Arco Maior e a pedagogia da misericórdia
To build a democratic and fair school: Arco Maior project and the pedagogy of mercy
Joaquim Azevedo
El dia del número, mejora la actitud hacia las matemáticas (Motivación de las Matemáticas)
The day of the number improves the approach to mathematics (Motivation of Mathematics)
Salvador Vidal Raméntol
To what extent does genetic content in textbooks contribute to scientific literacy? Analysis of STSE issues in textbooks
Em que medida o conteúdo sobre genética nos manuais escolares contribui para a literacia científica? Análise dos temas ciência-tecnologia-sociedade-ambiente em manuais escolares
Florbela M. Calado | Franz-Josef Scharfenberg | Franz X. Bogner
Aspetos morfológicos do tratamento de dados na gestão escolar. O potencial do Analytics
Morphological aspects of data processing in school management. The Analytics potential
António Andrade | Sérgio André Ferreira
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